25ú25’40″S 49ú16’23″W && MSST bunkers

“Se um homem que tivesse a habilidade de transformar-se em muitas pessoas e imitar todas as coisas chegasse a nossa Cidade e quisesse fazer uma performance dos seus poemas (…) dirí­amos a ele que não existe este tipo de homem em nossa Cidade e nem sequer é permitido que haja. Depois de derramar mirra em sua cabeça e coroá-lo com louros, mandá-lo-í­amos para outra Cidade.”
Sócrates – A República

(Utopia Aplicada – glerm soares)

Entrevista de glerm soares p/ Estrela Leminski, para um Doutorado em etnologia da música curitibana. Algumas canções e coagulações pontuando o diletante tateando.

Onde você nasceu?

Curitiba-PR Brasil. América.

Você é descendente de europeus? Quais? Sabe a sua história?

Também. No lado materno tenho mais afirmada a ascendência européia pois vieram de colônias alemãs, minha mãe foi da primeira geração a casar fora da colônia. Originalmente são da região gaúcha de Ijuí­, Cruz Alta, Santa Rosa, Horizontina, Santiago, Tupanciretã (Oeste do Rio Grande do Sul). Curiosamente a famí­lia do meu pai também é da mesma região, porém na famí­lia dele ja tem um orgulho mestiço anterior, diz-se que são descendentes de Bugres, o que não diz exatamente uma etnia e sim é um tipo de apelido da raí­z í­ndigena por ali (bastante próxima dos Guarani, mas devem haver outras raí­zes perdidas nos povos das missões). Recentemente meu pai me disse que sua avó casada com o avô bugre era italiana, disse até o nome e sobrenome dela, mas acho que hoje já estão distantes estes 8 ou 16 sobrenomes…

(Dinossauro de Proveta – glerm soares)

O que é a música Curitibana?

Realmente não sei. Música feita em Curitiba ou música feita por curitibanos? Música feita por descendentes de curitibanos? Uma música que só exista aqui e tenha a cara daqui? É uma cidade bastante provinciana até hoje (pelo bem e pelo mal), que não vive de um ethos cultural próprio e sim de um suposto cosmopolitismo (um cosmopolitismo afetadamente provinciano), o que implica ser uma cidade de consumidores mais do que produtores. Certamente temos vários avatares para afirmar e louvar, que ainda habitam aqui ou até mesmo constroem um imaginário das ruas e mitos locais, porém acho que tendem a fechar-se nelas mesmas quando ficam nessa pequenez de “cena local”. Qual o raio dessa “cena”? Região metropolitana? Ecos em São Paulo e pontuais festivais de gênero em capitais? Muita gente boa com certeza, mas hoje acho bem problemático um músico daqui não extravazar para outros sintomas metropolitanos. A internet acabou com as fronteiras, vivemos uma época de encontrar mapas mais multidimensionais do que o plano cartesiano geopolí­tico. A pergunta sobre “cena” até fazia algum sentido nos anos 90, o auge daquele delí­rio de gravadoras pseudo-independentes (braços de multinacionais) e os cadernos de cultura dos jornais criando cenários, mas era sofrido, pra que repetir aquilo? Hoje é possí­vel identificar pares em qualquer sí­tio do planeta e encontrar seu circuito. Se música curitibana é só aquilo que sai no caderno G da Gazeta do Povo, eu tou fora. A história que vivo é contemporanêa e sem fronteiras.

(Coroa da pena do pássaro sagrado da eternidade – Matema )

Quem são os principais grupos compositores ou autores de Curitiba?

Octavio Camargo, Felipe Cordeiro, Lúcio Araújo, Nillo Ferreira, Gus Pereira, Renê Bernunça, Thadeu Wojciechowski, Marcos Gusso, Rubens Kulczycki, Chico Mello, Barbara Kirchner, Gustavo X.X.X., Jr. Ferreira, Gengivas Negras, Domingos, Wandula, Ruí­do por milí­metro, Magog, Woyzeck, coligere, Igor Ribeiro, Limbonautas, Pogobol, July et Joe, Pelebrói não sei, Imperious Malevolence, Beijo aa Força, Chucrobilly, Marcos Prado, Orquestra de Sopros de Ctba, Digão Duarte, Manoel Neto, Ademir Plá, Mamelucovich, Observatório Nome de Mulher, L.F. Leprevost, Malditos ícaros do Microcosmos, Tenuipalpus Blanch, Matema, um guri de 12 anos que tava tocando violão numa festa da Bicicletada e aquela banda do Rimon que eu não lembro o nome, um amigo gaúcho (Cristiano Figueiró) que morou aqui 6 meses e fez umas 5 músicas conosco, Pan&tone (portoalegrense) e rbrazileiro (olindense) fazendo barulho com Orquestra Organismo no espaço E/ou… essa lista vai aumentar todo dia e não vai ter lógica temporal ou geográfica. Eu moro aqui e quando não moro volto, tudo que é feito aqui ou por gente que ja passou por aqui é daqui também… Muito difí­cil pra mim pontuar isso, porque pra mim é uma vida diária e cada vez que algo soa e que eu estou junto… Ja toquei com uma banda carioca (Jason) na Eslovênia. Ja berrei trechos do Catatau (Paulo Leminski) fazendo música com amigos valenciano, recifense e siciliano na Noruega ou com bahianos, paulistas, gaúchos e outros ainda sem cidadania curitibana em Recife. Aquilo era música curitibana? Também. Mas do sintoma metropolitano deles também, lembrando ainda que o Catatau fala exatamente disso, deste sentimento de ser um pária na própria lí­ngua materna tentando filosofar por categorias que botam em cheque meu latim.

(Leite em Pó – glerm soares)

Você atua de que maneira na música curitibana?

Sendo curitibano e músico. Atualmente estou com um trabalho com software e hardware livre, fazendo softwares de música e instrumentos digitais artesanais que podem ser customizados por qualquer pessoa ( http://artesanato.devolts.org ). Tou com um projeto com gente de varias partes do planeta, chamado “Movimento dos Sem Satélite” (http://devolts.org/msst) disso sai música também, além de outros experimentos pós-industriais e questionamento da tecnocracia.

Quem faz música em Curitiba?

Quem quiser. Música não tem fronteiras e aqui não vamos pedir passaporte ou tolerar xenófobos.

Qual é o papel da polí­tica cultural em Curitiba?

Abrir os olhos para uma arte menos alienada em mercado, em genêro musical, em formatos midiáticos fechados. Mandei um projeto pra construir instalações sonoras e instrumentos de artesania digital pro edital de música municipal, ele não passou. O mesmo edital passou em artes visuais. Sabe por que? Porque o edital de música entendia que música é gravar CD e fazer show em palco… agora que ta aparecendo uns editais de publicar songbooks… Gravar CD, prensar 1000 CDs pra ficar dando pra editor de caderno de cultura de jornal escrever uma notinha que amanhã todo mundo esqueceu… isso é polí­tica cultural? A polí­tica cultural deve investir na base, Universidades livres e liceus de luthiers e musicólogos, em espaços autônomos, em produção de tecnologia musical e de publicação de conteúdo aliada a criatividade artí­stica. Deverí­amos ter mais rádios livres, estúdios livres, rádios universitárias. Essa polí­tica que finge estar aliada a um pseudo-mercado que nunca existiu por aqui é muito deprimente. O festival de música de Curitiba é um bom eixo, mas poderia ser menos elitista e buscar atender outros fluxos fora os acadêmicos, como arte sonora independente de formação musical proposta por artistas conceituais ou outros poetas e boemias. Aquela divisão “M.P.B” versus “erudita” é muito gagá, eu posso ser um erudito do punk, do noise, da música concreta ou eletrônica, ou posso também estar propondo a criação de paisagens sonoras num ambiente público, nas ruas – e isso seria popular, porque não?

( 0xriFFFFFFFFFFFFFF – glerm soares )

Quais caracterí­sticas você apontaria na música Curitibana?

Cosmopolitismo provinciano, confusão ideológica, português estranho, inglês britânico ou ramonesco, punk finlandês, indie í­ndio, academicismo diluí­do, erudição onanista, cageanos de raí­z, elektronische musik, kraut rock, musique concrí¨te, caipira-curupira-capital, catatau, góticos, pós-punk antes do punk, no-wave cheio de onda, industrial cabeção, psychobilly, macumba pra gringo & mpb pra turista, desespero, ansiedade, perfeccionismo extremo paranóico obsessivo. Falo tudo isso no bom sentido. 🙂

Qual é o lugar de curitiba no mundo?

latitude 25ú25’40″S e longitude 49ú16’23″W

( Gambi Mimese – glerm soares )

Como é a relação da música de curitiba com a indústria cultural?

Depende de qual indústria você se refere. Uma indústria local que autoconsome música composta em Curitiba por seus cidadãos ou habitantes? Uma indústria brasileira ou global da música e sua relação com esta produção local? Seria preciso analisar todos os fatores: industria fonográfica, circuito midiático de rádio e tv, festas e festivais, interrelações com outros circuitos fora deste raio municipal. O problema industrial continua sendo o mesmo: uma grande fatia da produção independente querendo responder a uma suposta demanda dos veí­culos de massa, as rádios e tvs abertas que tem concessão pra operar impondo um padrão de comportamento que supostamente responde a um mercado de celebridades. Mas no fundo isto é uma máquina de iludir pessoas criativas a entrar num filtro cruel de servidão a um status quo cultural.

Acho curioso que Curitiba tenha um Festival de Teatro e de Música que atrai tantos estudantes e diletantes destas artes do Brasil todo (considerando aqui que teatro precisa de música também), mas que não gere uma continuidade profí­cua de produção local consumida naquela mesma escala e voracidade. São dois Festivais diferentes em alguns aspectos, pois o festival de música tem um viés didático e parece ser consumido mais por pessoas interessadas na música como métier, já o festival de teatro é uma espécie de carnaval municipal onde as pessoas são guiadas pelo programa das peças mais caras e oficiais, peças que tem atores da globo no elenco e outras figurinhas carimbadas. O curioso é que isso não seja suficiente pra firmar a cidade como um pólo produtor autosuficiente e confiante de suas intenções.

Vale também analisar o circuito de música urbana descendente direto do rock europeu e norte americano, nos anos 90 era fortí­ssima a diversidade com festivais como o B.I.G. (bandas independents de garagem), o selo Bloody e algumas outras coisas que sucederam. Mas aquela iniciativa sucumbiu a suposta necessidade de incluir-se no eixo Rio-São Paulo entrando naqueles selos pseudo-independentes, braços de multinacionais. Aquela época a internet fez muita falta e a articulação fora desta perspectiva era muito mais lenta. No fim dos noventa veio o estouro do rock feito pra MTV e acho que isso ainda domina até hoje este circuito, neutralizando possibilidades realmente alternativas, que nos melhores casos corre pelas bordas e vai muito bem, fazendo suas conexões em circuitos bem especí­ficos, achando seu lugar por dentro da internet.

Um exemplo interessante e bem especí­fico curitibano ja firmado nessa primeira década dos 2000 foi o PsychoCarnival, que acabou virando uma meca de um genêro bastante peculiar, derivado ali de bandas como Cramps e Meteors, mas com uma raí­z bem especí­ficas em bandas curitibanas como Missionários e Cervejas e toda aquela cena “punk o’ billy” que rolava no fim dos oitenta também em outras praças.

Mas a palavra indústria já é por si só muito cruel. Prefiro pensar a música se reproduzindo e sobrevivendo como um organismo, um ser-vivo com sua própria subjetividade do que essa coisa de esteira de montagem.

De alguma maneira a configuração dos imigrantes europeus refletiu na música de Curitiba?

Da mesma que a resistência nativo-americana, africana, asiática e de outros continentes perdidos, pois o que não reflete, reverbera como falta. Agora, nessas décadas que sucedem ao delí­rio industrial do século dos estados-nação, somos muito mais universais, somos muito mais poliglotas e o limite dos continentes são só estes oceanos a serem transpostos com nossa música em comum. A música pode revelar este elo perdido onde a diversidade de nossas raí­zes entram em curto-circuito e criam cidades psicogeograficas entre os pares.

(Da capo! – ensaio de orquestra – Fellini )

A volta da ficção: escolha seu simulacro

Existem nas recordações de todo homem coisas que ele só revela aos seus amigos. Há outras que não revela mesmo aos amigos, mas apenas a si próprio, e assim mesmo em segredo. Mas também há, finalmente, coisas que o homem tem medo de desvendar até a si próprio, e, em cada homem honesto, acumula-se um número bastante considerável de coisas no gênero. E acontece até o seguinte: quanto mais honesto é o homem, mais coisas assim ele possui (“¦)

Agora, quero justamente verificar: é possí­vel ser absolutamente franco, pelo menos consigo mesmo, e não temer a verdade integral?

Fiódor Dostoiévski, Memórias do Subsolo, pg. 52 – (Editora 34)

Buracos no jardim

Como sem a mí­nima condição de definir – o som que soa, % de um sí­mbolo que significa, sem fugir. Estes fazem o que fazem, quase dejetos em impuras escavações. Sí­ntese de tesouros escondidos pelas mãos dos que pretendiam (ou preferiam) guardar as sobras. Degenerar e regenerar, magneto de pólos sombrios, frios como geada congelada. Faltam algumas palavras pra por na risca o x da questão: agora não tem mais volta. Se novamente perguntassem o porque de tanta obsessão. Que perseguição. Ei, diga lá! Faz deduzir como causa um escrito – só falta agora achar o bilhete – como a agulha do palheiro. Frame enterrado, um palito de fósforo talvez, enferrujado até o pó como faí­sca que ilumina estas criaturas. Se fosse jogo serviria como pino de boliche, se fosse o tempo seria o foi. Banda garagaica: inúmeros bombardinos e abstrações, figas da mãe, já grisalhas das luas cheias, tantas e tantas voltas pelo tonto lugar – bóias pra imaginação. O vento toca uma música, faz voar todas as anotações, cérebro obtuso, catatônico de tanta cisma. Mal da vida.

Guerreira da noite vai e volta sem se perder, sem se encontrar – “mesmo assim o labirinto é longo e escuro” disseram. Grito: sussuro na curva da prostração com o rabo em meio a cova, sinuca de bico, vai e volta pra santa hora do veneno, três vezes ao dia ou mais – amolação pelo troco da feira, moeda perdida, amuleto da mais desgraça. Sem meios pra se retratar, eis mais um acorde dissonante, dessa vez na ponta do quebra galho, puro cacoete passado pela aflição do só pra variar. Simples como cartilha, onde o que falha leva a culpa de brinde, decoreba desse mal estar: um suspiro pregado pelas marteladas rí­tmicas, truculentos cruzamentos nessa afiada música. O caráter anda mal das pernas, pode crer, engarrafado no meio do oceano, nadando contra a corrente pelo ensejo de se perder perder perder – triângulo amoroso, trí­plice aliança – sangrado e mofanado – corpo éter sem dó nem beira. Acorda cedo e esvai trabalhar. Necrotério e saliva do fundo da garganta, em voz alta e bom tom: VAI DE TORTA LINHA RETA!

Icone inédito, mal falado e embolorado.

destino das Oito/Fate at Eight/Schicksal um acht – chico mello

It was a good luck that the festival MaerzMusic had two promising focal points – the human voice and the Brazilian music. Especially in Brazil the experimental and most involved musicians often are getting in touch with popular music. Chico Mello lives in Brazil and in Germany. He created his own style of music theatre. Here he is combining the for the Brazilians very important form of TV soap opera, the ââ?¬Å¾Telenovela”, with Bossa Nova. The result heââ?¬â?¢s calling TELEBOSSA. His piece, with the title ââ?¬Å¾Destino das Oito/ Fate at Eight”, was first performed in a marvelous light and ironic-imaginative production by Christina Tappe at the Berlin festival MaerzMusik.
The dramatic basis gave the British author Caryl Churchill. On the other side Chico Mello discovered with his own son how important repetitions are for narrating stories.
For this reason Mello was able to reflect in a light and ironic way the stupid and at the same time abysmal rituals of every day rituals, constantly served by TV soap operas.
Musically Mello connected the cool sensuality of Bossa Nova. He permitted the singers and musicians just to use certain notes and rhythms. The result was a sound on the golden mean in-between Alban Berg and Joao Gilberto. Rarely contemporary music theatre as Chico Mellos DESTINO DAS OITO – without falling in cynicism – offers so much ground for laughing and reflection.

Volker Michael, Deutschlandradio Kultur, Berlin

The play

A family waits for the return of the daughter. Captivated in the vacuum of every-day rituals the couple Brian and Alice repeats together with aunty Maisie again and again the same procedures. Change lies in commonness with trivial problems: misunderstandings, conflicts with the wayward drunk son, feelings of guiltiness, fear, old secrets, affairs, addictions, absurd encounters, departure, death. Will the daughter arrive? Will she bring the redemption from the deadlock?

ââ?¬Å¾Destino das Oito – Fate at Eight – Schicksal um Acht” is the setting to music of the drama ââ?¬Å¾Heartââ?¬â?¢s Desire” (1997) by the famous British Author Caryl Churchill. Caryl Churchill, born 1938, is one of the leading British dramatists. Her plays are extremely political and deal with social alienation and mechanisms of power. Very effectively she combines formal dramatic experiments with exciting political issues
In ââ?¬Å¾Heartââ?¬â?¢s Desire” the realistic situation of waiting for the daughter becomes a dramatic unrealistic elaboration – the story of waiting is narrated in a non-linear way. The dramatic development constantly is interrupted and restarts from the beginning. In a situation of a reset the story gets a new possible development. Every reset, every repetition includes musical and scenical variations. The result: an absurd and funny, constant perplexity of references in time and space.

The grotesque play with repetitions and interruptions get in the musical setting of Chico Mello a new dimension. Every beginning brings new variations and events and clears up the exciting patterns of the dramatic play.

The concept
The narrow patterns of family, the family issues themselves are very similar to the dramatic constructions of popular TV soap operas, of the famous Brazilian ââ?¬Å¾Telenovelas”. The action itself seems to be realistic, full with social and psychological situations of the brasilian every day life. This genre of soap opera gives a high emotional identification for a huge audience. For a big part of the brasilian population the main protagonists are as close as family members. The everyday life is dedicated to the world of Telenovelas – the Telenovela copies problems of the common life.

The formal and dramatic constellation of ââ?¬Å¾Heartââ?¬â?¢s Desire” gives an ideal basis for an investigation of this entanglement. Similar as is in a TV setting the audience can experience how the protagonists fall into their own soap opera. For this reason the play ââ?¬Å¾Heart`s Desire” becomes a free interpretation in the fictional telenovela ââ?¬Å¾Destino das Oito – Fate at Eight – Schicksal um Acht”.

By linking together different possibilities of action and dramaturgic developments in one series, by the scenic interaction of real action and telecasting, by mixing pictures from real telenovelas and live-videos arises a performance where the borders of TV and reality, of real and artificially produced experiences fade away.

The most important Brazilian telenovela is daily broadcasted at eight o�clock: a collective fate, broadcasted at eight, played by fictional protagonists, experienced by the majority of a huge tv-audience.

The music

The musical composition takes this dramatic structure and works with it�s patterns of repetition and variation. The recurrent basic situation is taken for a musical fundament and opens many possibilities for the exploration of an own musical language. The composer develops a special musical vocabulary. This he adds to the harmonies of the vocals of the English text. The result will be a fine grid of melodies, that are not motivated in a psychological or affective way, but offer an artificial construction for the naturalistic scene. In this exciting combination of Chary Churchill`s excellent composed text, the artificial vocal inflection and a naturalistic scene the rich diversity of the play becomes evident. The funny absurdity and the complexity of trivial daily scenes become even more obvious.

The clear language patterns made the composer develop an own “alphabet” of pitches directly out of the vocals and consonants of each syllable of each word. Chico Mello constructed an own system of composition that gives every figure it`s special character, and of course repeating í­ non harmonic – melodies to each reply. The basis of the work is the entire text.

Each singer-actor has 1 or two 2 accompanying instruments, as follows:

Brian + Bariton Saxophon + Contrabass
Alice + Clarinet + Viola
Susy + Celesta
Maisie + Oboe + Violine
Lewis + Tuba + Contrabass
Official + Percussion

Similar as in previous compositions (“Amarelinha” and “do lado de lá” for orchestra), Chico Mello works with ââ?¬Å¾decontextualisation” of Boss Nova. The “Tele”-“Bossa” is a combination of brasilian Telenovela and the musical genre of ââ?¬Å¾Bossa Nova”. In both forms strong emotions are produced by repeating patterns. The difference is the melo-dramatization of emotions in telenovelas to the static condition of happiness and sadness in the Bossa.

In the new music-dramatic form of ââ?¬Å¾Telebossa” the dramaturgy of telenovelas is so to speak ââ?¬Å¾bossanized” – an exciting contradiction, intensified by the scenic action.

Social Music Kiosk – Vienna

Social Music Kiosk
(on-air, on-line: http://www.kunstradio.at, Sunday, Nov 25th, 23:00
Brandon LaBelle

In conjunction with the Kunstmarkt event held at the Schí¶pfwerk housing community in Vienna in October 2007 where art was used as a meeting point for social diversity, Social Music Kiosk functions as a gathering of different narratives related to art and social environments. Originally staged as an artistic contribution to the Kunstmarkt, the Kiosk functioned as a participatory sonic platform, inviting visitors to add to the mix by way of their favorite CDs, audio reports made on-site, and live treatments and interactions. Using the Kunstmarkt as a base, the radio work overlays multiple inputs: a series of audio recordings made by local residents and visitors to the Kunstmarkt, an interview and discussion with the organizers of the Kunstmarkt and social workers from Schí¶pfwerk, and electronic treatments. Part-documentary, part-question and answer, and part-mix, the work is a telescoping of multiple perspectives onto a social topography.

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http://www.kunstradio.at/2007B/25_11_07.html
Thanks to Ulla Ebner for her DJing, Annette Stahmer for her assistance, and to Rudolfine Lackner, Renate Schnee and Sabine for their invitation and conversation.

*

Brandon LaBelle is an artist and writer working with sounds, places, bodies, and cultural frictions. He is the author of Background Noise: Perspectives on Sound Art (Continuum 2006) and co-editor of the Surface Tension (Errant Bodies) series. His recent work Prototypes for the mobilization and broadcast of fugitive sound was exhibited at the Enrico Fornello Gallery, Prato. He teaches at the University of Copenhagen and is currently developing projects on street cultures.
http://www.errantbodies.org/labelle.html

Diabolus in Musica

J.C. –
O diabo é um idiota, Sr. Flusser?
V.F. –
Há uma faceta idiótica no diabo. Desde que a palavra seja tomada no seu sentido grego. A idiotice é a vida, em particular na economia. Um dos deveres do diabo é seduzir-nos para a integração na famí­lia e no emprego. Além disso, o paraí­so da satisfação que nos é prometido pelos diversos messianismos psicossomáticos, psicanalí­ticos e econômicos é uma das metas do diabo enquanto idiota.
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J.C. –
Se o diabo implica Deus, este é também um idiota?
V.F. –
Se o termo Deus pode ter significado, este seria meramente negativo, a saber, “não-diabo”. Desde que nessas perguntas a idiotice do diabo foi salientada, Deus poderia ser concebido como a negação da idiotice, portanto, como o lugar da alienação, da famí­lia e da economia; portanto, da natureza. Resumindo, o idiótico no diabo seria sua sedução para a natureza e Deus seria a sedução para fora da natureza.

J.C. –
Explique-se melhor.
V.F. –
Poderia dizer que no homem há duas tendências: aquela que faz o homem integrar-se na natureza e aquela que o propele para além dela. A tendência integralista é aquela que chamei de diabólica na sua primeira pergunta. Mas seria simplificar demais querer, por isso, identificar a tendência alienadora com a divina. O diabo não é apenas idiota. Ele não seduz também para uma forma de alienação, mas diversas formas.

J.C. –
Isso tudo é muito bonito, mas me parece estudado demais. A alienação não é também uma forma de engajamento?
V.F. –
Sem dúvida. Os termos alienação e engajamento são relativos. Se de fato há duas realidades no homem, uma natural e outra valorativa, toda vez que o homem se engaja na natureza para valorizá-la, aliena-se dos valores mesmos. E toda vez que se engaja na contemplação dos valores, na pura teoria, aliena-se da dimensão natural que o caracteriza. Em outras palavras, a ambivalência humana (a sua liberdade de seguir o diabo ou Deus) reside injustamente no fato de que em toda escolha é simultaneamente um aceitar e um recusar de algo meu.

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J.C. –
Então para a juventude moderna, os termos alienação e engajamento significam a mesma coisa? Isto é, tanto faz estudar filosofia como defender o flagelado nordestino?
V.F. –
Significam a mesma coisa no sentido de serem fugas parciais, embora em dois sentidos diferentes. Se me decido a engajar-me em prol do flagelado fujo de uma realidade em mim que me propele para a filosofia. E se me decido para a filosofia, fujo da realidade do flagelado que afinal de contas também é minha. Naturalmente posso encobrir este dilema trágico com bonitas palavras, dizendo que sacrifico a minha tendência filosófica no altar do flagelado, ou que sacrifico o flagelado no altar da filosofia. Mas deve ser claro que em ambos os casos trata-se de má-fé. É por isso que eu disse que o diabo também funciona como sedutor para a teoria. E o diabo dispõe de mais um truque neste caso; pode insuflar-me que, ao empenhar-me no flagelado, também de alguma forma filosofo. E que ao filosofar, também de alguma forma ajudo o flagelado. Como vê, a situação é extremamente complexa e confusa, que é aliás o significado da palavra diabo.

J.C. –
Concordo que seja confusa, mas não a ponto de imaginar que Heidegger possa fazer algo pelos nordestinos. Isso me parece de extremo cinismo.
V.F. –
Pois é, concordo que é cí­nico, e que a atitude honesta é admitir que quando me decido para o engajamento ao nordestino perdi uma dimensão da minha existência, e a perdi definitivamente, já que todo o instante é irrevogável; e, também, quando me decido para a filosofia devo por honestidade admitir que traí­ a minha capacidade de engajar-me no nordestino. É nesta honestidade que se revela a agonia da existência humana.

J.C. –
Fala-se demasiadamente em sexo. O diabo tem algo a ver com isso? Ele se encontra nas ante-salas do amor e incita ao pecado? Veja o sr. que as revistas e publicações modernas incluem sistematicamente fotografias e falsos estudos de sexologia com o intuito de espicaçar a libido do leitor. Seria o diabo pecador?
V.F. –
Gostaria de enquadrar este problema também no contexto do desenvolvimento. O que impressiona um viajante brasileiro nos EUA. é a circunstância de ter sido o sexo aparentemente abolido pelo diabo em prol de pecados mais refinados. As revistas que você menciona estão sendo vendidas em massa na rua 42, o que provoca apenas bocejos. No seu desenvolvimento, o diabo superou o sexo e a juventude americana usa portanto o sexo como meio para alcançar popularidade, como aqui ainda utiliza-se a popularidade como meio para alcançar o sexo. Comparada com a situação americana a sexualidade da juventude brasileira, longe de ser pecaminosa, parece pia.

J.C. –
E o adágio “faça amor e não a guerra” é um convite ao amor ou uma distração da guerra?
V.F. –
O adágio comprova exatemente o que acabo de dizer. No contexto desenvolvido o ato sexual, se ainda for conseguido, é um sintoma de simplicidade cristã e voltado para a sanidade ingênua. Com efeito, o ato sexual neste contexto é algo semelhante í  sentença do Cristo: tornai-vos como crianças. Compare o ato sexual, que afinal é um ato natural a dois, com as cenas psicodélicas em [Green Village].

J.C. –
Os “hippies” são, ao que parece, os últimos cristãos sobre a Terra, afinal pregam descaradamente o “amai-vos uns aos outros”. O que fazem eles em [Green Village]?
V.F. –
Justamente, o problema é o de distinguir Deus do diabo. Se os hippies te parecem ser cristãos é que estams perdendo a noção da distinção entre o bem e o mal. Finalmente Nietszche alcançou-nos.

J.C. –
E daí­?
V.F. –
Quando Nietszche falou que estamos no além do bem e do mal ele estava apenas articulando o desespero individual e profético. Agora esse desespero da indiferença alcançou-nos com camadas amplas.

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J.C. –
Camadas amplas brasileiras? Veja bem, sr. Flusser, aqui e agora esse Nietszche como pode ser aplicado?
V.F. –
Na nossa situação de intelectuais paulistanos estamos literalmente flutuando sobre um abismo. Se enquanto intelectuais participamos da problemática da nossa época que é a problemática do super-desenvolvimento, enquanto paulistas participamos da problemática do sub-desenvolvimento. De maneira que o diabo nos agarra de ambos os lados, na forma nietszcheniana da indiferença e na forma tradicional da impotência ante problemas fora do nosso alcance. Estas duas garras se superam dialeticamente da seguinte forma: recusamo-nos de agir já que nenhuma ação adianta e já que toda ação é indiferente. Ou agimos a despeito da nossa plena consciência da inocuidade da nossa ação e da aleatoriedade da nossa escolha. No entanto não quero negar que talvez haja uma brecha nas garras do diabo. A nossa tarefa é talvez encontrá-la.

J.C. –
É isso que senhor tem pretendido ao longo de sua vida?
V.F. –
Tenho caminhado em duas direções diferentes. Na primeira etapa procurei encontrar-me negativamente, isto é, por redução sistemática de todas as falsidades que deturpam a visão da situação na qual nos encontramos. Sem ter alcançado essa meta talvez movido por impaciência, iniciei uma segunda etapa, na qual procuro, na medida das minhas forças extremamente limitadas, influir na situação imediata no sentido de um saneamento conta essas falsidades. Em outras palavras, publico e ensino.

J.C. –
O sr. vem sido acusado sistematicamente de ótimo poeta. Agora vejo que seus acusadores têm razão.
V.F. –
Se você levar a pergunta a um campo pessoal, devo admitir que me engajei em filosofia e que portanto resisti ao diabo idiótico para talvez cair nas malhas de um diabo estetizante. Com efeito, a filosofia e a teologia são para mim indistintas, já que ambas propõem o terreno do até agora não pensado, e o propõem no clima da beleza. Não me iludo; sei que a minha decisão em prol da teoria é uma decisão que abre mão da minha ação imediata no campo daquilo que é geralmente chamado de subdesenvolvimento. Como desculpa, que talvez me foi insuflada pelo diabo, só posso recorrer ao seguinte: talvez a minha incompetência seja um pouco menos desesperadamente limitada no campo da teoria, do que na ação imediata.

J.C. –
O sr. falou em subdesenvolvimento. Se somos subdesenvolvidos, como o diabo se comporta entre nós? Ele o é igualmente? A figura de um diabo subdesenvolvido me parece extremamente melancólica.
V.F. –
Pelo contrário, no subdesenvolvimento o diabo tem muito mais seiva, seduz com armas tão ingênuas como o são o sexo e o dinheiro. E castiga com pragas tão palpáveis como o são a doença e a fome. Compare isso com o diabo desenvolvido.

J.C. –
Assim nos EUA o diabo morreu?
V.F. –
Quem morreu obviamente é Deus, ou como dizem os bottons americanos, vive mas não quer ser envolvido. O diabo nos EUA seduz por pseudo-comunicações e pseudo-sensações e castiga pelo tédio e pela falta de meta, mas não se iluda com a “cocacolonização” do Brasil, também, há infiltração deste tipo adiantado no nosso meio.

J.C. –
O senhor falou em comunicação que já me parece uma palavra gastí­ssima. Afinal, ela significa verdadeiramente algo?
V.F. –
Você tem razão, já ouvi que os que não podem comunicar poderiam calar a boca. Quando falei em pseudo-comunicação referi-me justamente í quela massa de mensagens sem informação que amalgama as solidões individuais em solidões coletivas. Não resta dúvida que exista comunicação autêntica. Não quero recorrer ao exemplo do amor, já que esse nosso diálogo presente prova ser ela possí­vel. Aventuro a tese que onde há autêntica comunicação, isto é, onde dois seres humanos se abrem mutuamente o diabo é derrotado. Talvez por isso mesmo a comunicação autêntica é tão rara. Por exemplo, será que esta entrevista comunicará com alguém entre os leitores?

J.C. –
É outro lugar comum, sr. Flusser, dizer que a incomunicabilidade destroi o amor. Talvez os seres não se comuniquem simplesmente porque não há nada para se comunicar. O diálogo já foi há muito interrompido, talvez por se ter alhures realizado. Agora há o silêncio, o ensimesmamento de que falava o cordial Ortega.
V.F. –
Você está tocando num ponto crucial da problemática da felicidade. A nossa tradição imagina a felicidade como um lugar de eterna contemplação e também de diálogo eterno. Compare Sócrates com o cristianismo. Mas há uma óbvia contradição nessas duas imagens. Onde há contemplação não pode haver diálogo porque todas as informações possí­veis já foram trocadas. Nesse sentido a felicidade é tédio imenso e não pode haver diálogo, onde há diálogo não pode haver contemplação porque o diálogo é um processo, portanto algo imperfeito. Em suma, a felicidade é inimaginável.

J.C. –
Assim, o céu é um lugar miseravelmente silencioso e entendiante?
V.F. –
Já disse que não podemos sequer imaginá-lo, mas certamente um dos seus aspectos está sendo realizado na terra, a saber nos subúrbios novaiorquinos e outro aspecto nos parques de cultura e diversão moscovita.

J.C. –
No seu livro “A história do diabo” o senhor se referiu ao Brasil como sendo um território periférico do Ocidente, em cuja sociedade se distinguiam dois traços fundamentais: a tristeza e a preguiça, cuja superação seria a meta do pensamento brasileiro. Ainda endossa essas palavras?
V.F. –
Permita um esclarecimento: tristeza e preguiça no trabalho mencionado na pergunta são termos emprestados í  terminologia teológica da Igreja e são usados ironicamente. Traduzidos para uma linguagem mais comum seriam aproximadamente ideologia alienante e ensimesmamento mistificante. Subscrevo ainda a afirmativa anterior que superar tais perigos é, ou deve ser, a meta do pensamento dos que habitam o Brasil, como aliás do pensamento tout court. Admito que a grandiloqüência alienada e alienante é maior no Brasil do que, por exemplo, na França e neste sentido admito ser o Brasil território periférico do Ocidente. Mas não admito tratar-se de juí­zo valorativo. Trata-se simplesmente da constatação que o Brasil enfrenta os acontecimentos atuais de posição diferente da ocupada pelos paí­ses ditos desenvolvidos, embora os eventos enfrentados sejam os mesmos: a lenta decadência dos valores ditos ocidentais e sua substituição por outros ainda mal definidos.

J.C. –
Seu livro “A história do diabo” me parece ser uma longa e penosa meditação sobre a morte. O senhor pretendeu forçar o leitor a pensar na morte, principalmente, é claro, o leitor brasileiro? Se o fez, por que o fez?
V.F. –
A elaboração daquele livro fez parte da minha primeira etapa. Com efeito, a conversa fiada que encobre a morte me parece ser a máxima falsidade a ser destruí­da. Se publiquei o livro, foi depois de muitas dúvidas, hesitações e devo dizer que felizmente o livro teve uma repercussão pequena. Exije não apenas uma ginástica mental por parte do leitor, mas também uma prontidão de brincar comigo que poucos terão me concedido. Mas as minhas publicações posteriores já são deliberadas, fazem parte da segunda etapa.

J.C. –
Isso quer dizer que o diabo riu por último?
V.F. –
Não superei a problemática do diabo, apenas decidi-me contra a loucura. Se tivesse continuado no mesmo caminho teria perdido o controle crí­tico dos meus pensamentos, portanto optei pela sanidade e contra a radicalidade de pesquisa. Outra demonstração do fato de que toda escolha prefere uma alternativa em detrimento í  outra.