Editorial de O Globo após o golpe militar. Editorial de 2 de abril de 1964.
RESSURGE A DEMOCRACIA
Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os
patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou
opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a
democracia, a lei e a ordem. Graças í decisão e ao heroísmo das Forças
Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão
dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil
livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para
rumos contrários í sua vocação e tradições. Como dizíamos, no
editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da
subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da
legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições,
como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada.
Agora, o Congresso dará o remédio constitucional í situação existente,
para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino,
sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades
públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em
favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a
levar í anarquia e ao comunismo. Poderemos, desde hoje, encarar o
futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas
terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com
má-fé, demagogia e insensatez.
Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros
devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus
inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao
dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a
garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram
a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um
daqueles poderes, o Executivo. As Forças Armadas, diz o Art. 176 da
Carta Magna, “são instituições permanentes, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da
República E DENTRO DOS LIMITES DA LEI.
No momento em que o Sr. João Goulart ignorou a hierarquia e desprezou
a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra,
saiu dos limites da lei, perdendo, conseqüentemente, o direito a ser
considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições
indispensáveis í Chefia da Nação e ao Comando das corporações
militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no
Automóvel Clube, vincularam-no, definitivamente, aos adversários da
democracia e da lei. Atendendo aos anseios nacionais, de paz,
tranqüilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela
ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas
chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus
direitos, livrando-os do amargo fim que lhe estava reservado pelos
vermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal.
Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os
setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém
escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaram-se os mais
ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o
mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da
democracia no Brasil que estava em jogo. A esses líderes civis
devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto
que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso
não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi
contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer idéia que,
enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do
povo e o progresso do País.
Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com
os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão,
como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes
devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente,
as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil uma época de
justiça e harmonia social. Mais uma vez, o povo brasileiro foi
socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave
crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande
favor.